AMORES LIBANESES
Vez em quando permito a mim mesmo me surpreender. E foi o que aconteceu sábado passado quando fui ao cinema (ETC) sem nada saber sobre o filme a ser assistido. Às vezes me dou mal quando assim faço, mas não naquele sábado. Por cerca de 95 minutos me vi inserido em um mundo diferente, diverso e misterioso: o mundo feminino. O filme a que faço menção é ‘CARAMELO”, produção franco-libanesa que conta a história de cinco mulheres em diferentes fases da vida que vivem em torno de um pequeno salão de beleza. O título do filme faz referência a uma mistura ou pasta utilizada para depilação à base de água, açúcar e limão.
Neste pequeno e medíocre espaço cotidiano constrói-se com suave elegância, porém com não menos melancolia, um fascinante e profundo painel do universo e da alma feminina. De logo percebi, embora sem ainda saber, que estava frente a um filme que só poderia estar sendo dirigido por uma mulher, afinal nós homens por mais que tentemos jamais iremos adentrar com tamanha singeleza e afetividade nos pequenos detalhes dos intramuros deste mundo estrangeiro que é como disse acima o mundo feminino. Carecemos de sensibilidade suficiente para tal.
Feito a própria mistura que dá título ao filme, as histórias amorosas das cinco mulheres vão se interligando e dando uma consistência adocicada, porém como assim é feito com o caramelo utilizado no salão de beleza o mesmo pode ser doce, mas seu final é doloroso. Como é suave, bela e doída a alma feminina.
A direção sensível de Nadine Labaki (para surpresa minha a protagonista central da história, a estonteante personagem Layale) gera uma atmofera de tanta autenticidade que o filme passa uma certa lentidão que é apenas superficial, pois a vida na verdade nos passa tão ligeira. Assistimos assim o dia-a-dia rotineiro dessas mulheres e seus pequenos grandes amores, alegrias e sofrimentos. Se temos aí em comum o amor, cada uma das cinco personagens vivem a sua maneira o sentimento. Layale ama um homem casado e sonha que um dia ele possa deixar a esposa para ficar com ela, e envolta em seu impossível sonho pouco percebe ou dá valor ao sincero amor do guarda de trânsito que a idealiza a certa distância (antológica a cena em que Layale conversa com o amante ao telefone e o guarda do outro lado da rua espreitando-a estabelece imaginariamente ser com ela o diálogo). Nisrine que está prestes a casar vive o tormente de não ser mais virgem e o noivo não saber. Já Rima não se sente atraída sexualmente por homens e joga sedutoramente com uma cliente (sempre achei aquelas massagens com água morna e xampu que se faz no cabelo antes do corte algo meio excitável, e no filme tal carícia chega ao erotismo sublimável). Tem também Jamale, candidata à atriz que reluta em aceitar o envelhecimento e Rose que abre mão da possibilidade de finalmente amar e ser amada por um homem em troca de um outro amor: o amor por sua irmã mais velha que sofre mentalmente de demência.
Sutil, sedutor e sensual (assim comumente é o universo feminino) o filme vem me comprovar mais uma vez que a vida tem sua ambiquidade, isto é, é uma imensa comédia sobre inúmeros, inesgotáveis e diminutos dramas diários. Se o filme nos revela que por um lado homens cheiram a café, álcool e cigarros, também nos revela que por outro lado as mulheres cheiram a esmaltes, xampus e caramelo.
Assistam ao trailer do filme “Caramelo” e atentem para a encantadora trilha sonora que permeia o próprio filme e história:
em agosto 26, 2009 em 12:18 pm
Mesmo hoje em dia nós ainda precisamos de intérpretes.
em agosto 26, 2009 em 11:44 pm
Salão de beleza é um local, de fato, curioso. E a prova maior é que eu conheci este blog devido a um.
Em um lugar esteriotipado e subestimado pela grande maioria das pessoas, é possível, inclusive, se falar de arte. E assim conheci Flávia. E assim conheci seus escritos.
E desde já, se me for permitido, pretendo lê-los sempre que possível! E comentar sempre que me couber.
🙂